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Exposição

Produção Artesanal Portuguesa: 
A Atualidade do 
saber-fazer ancestral

A Exposição Produção Artesanal Portuguesa: a atualidade do saber-fazer ancestral tem como fio condutor a promoção do reconhecimento da atualidade e relevância da produção artesanal para a sociedade contemporânea, que pode ser percebida em quatro eixos: o do Sentido quotidiano das produções, o do Respeito pela paisagem, o do Valor cultural e o da Resiliência económica.     

Para além destes eixos transversais a todo o setor das artes e ofícios tradicionais, pretende-se destacar quatro características presentes em todos os artefactos de matriz ancestral, que surgem aqui exemplificadas através de utensílios concretos que as poderão ilustrar de uma forma mais evidente. O SimbólicoA Inteligência MaterialA Minúcia Técnica e O Abrigo são conceitos que se manifestam e se cruzam de forma fluida nos diferentes artefactos, revelando a mestria das artesãs e artesãos na resposta às diversas necessidades das sociedades em cada tempo.   

  

O conjunto de objetos presentes na exposição é assim uma seleção conduzida pela representatividade das características fundamentais inerentes às artes artesanais, pela diversidade de matérias-primas e da sua ligação aos territórios, pela diversidade do trabalho representado e pela abrangência do território nacional. Esta seleção reúne apenas peças produzidas atualmente, evidenciando o seu carácter contemporâneo. 

19 Liberté, Luxemburgo ©The Home Project Design Studio/2023

19 Liberté, Luxemburgo ©The Home Project Design Studio/2023

Espaço da Concas, Centro de Artes, Caldas da Rainha ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2024

Centro de Artes e Cultura, Ponte de Sor ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2024

O Simbólico

Os objetos que nos rodeiam no nosso dia-a-dia, para além dos usos práticos que lhes damos, contêm dimensões afetivas, pessoais ou de relação com um coletivo, através das quais nos ligamos a eles. 

As máscaras são o exemplo que elegemos para destacar a dimensão simbólica dos objetos. Para lá da expressão artística que lhes dá a forma, encerram significados que se exprimem na reprodução e manutenção de sistemas sociais e culturais através da sua participação em manifestações rituais. Apresentam uma grande diversidade, não apenas nos materiais utilizados na sua produção (madeira, cortiça, fibras vegetais, metal), mas também nas festividades de que são parte integrante e que acontecem no período que compreende o Natal e o Entrudo.

As máscaras no contexto português têm como denominadores comuns elementos de transgressão, de diabólico e de perturbador que se revelam tanto na sua confeção, como no comportamento dos mascarados que as exibem. As cerimónias de que fazem parte resultam de um tempo em que as sociedades rurais eram reguladas diretamente pelos ciclos agrícolas, atravessam o inverno, período do ano de maior alívio dos trabalhos mais pesados e de maior reclusão das aldeias sobre si mesmas, funcionando como elemento agregador das comunidades.

Máscara de chocalheiro “bravo”. Casimiro Lavrador. Bemposta, Mogadouro ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Máscara. Hélder Saraiva. Gonçalo, Guarda ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Junceto. Catarina Martins. Penedono ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Máscara da Corrida ao Entrudo. Pedro Longuinho e Manuel Claro. Aigra Nova, Góis ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2024

Careto do Entrudo. Sofia Pombares e Luís Filipe Costa. Podence, Macedo de Cavaleiros ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Careto do Entrudo. Adão de Castro Almeida. Lazarim, Lamego ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

A Inteligência material

A produção artesanal tem a sua origem na satisfação de necessidades próprias de um contexto marcadamente rural e com princípios de relação com a natureza que lhe são inerentes. A leitura e aplicação que faz da paisagem, respeitando os ciclos da sua sazonalidade e não comprometendo a regeneração de recursos, recorre a um hábil aproveitamento de formas e características naturais no desenvolvimento de soluções para o dia-a-dia.

Apesar do abandono gradual de antigas formas e modelos, alguns resistem na sua funcionalidade: no mobiliário, dos bancos às cadeiras; na cozinha, desde os objetos para confecionar, servir, transportar e conservar alimentos, às bilhas de conter e refrescar água; e até na adega, no uso das talhas para a produção e armazenamento de vinho. Os exemplos que destacamos são apenas alguns entre muitos outros bons exemplos que resultam de um sábio apuramento da aliança entre função, forma e material, desenvolvidos pela experiência prática ao longo dos tempos e que podem continuar a ter a sua relevância e atualidade. 

Talha. António Mestre. Beringel, Beja ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Bilha de 2 bicos. Olaria Quirino Ferreira. Carapinhal, Miranda do Corvo ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Alguidar. Olaria AGP. Bajouca, Leiria ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Caçoila. Olaria Artantiga. Molelos, Tondela ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Alguidar torto. César Teixeira. Gondar, Amarante ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cocharro. António Adélio Real. Portalegre ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Tarro bordado. António Adélio Real. Portalegre ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cadeira. Manuel Ferreira. Santarém ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cataplana. Analide do Carmo. Loulé ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cadeira de aba. Fernando Nelas. Gonçalo, Guarda ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Tanho. Artur Fonseca. Secorio, Santarém ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Banco com empalhamento. Manuel Pica. Baleizão. Beja ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cadeirão alentejano. Joaquim Boavida. Redondo ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Tropeço. António Adélio Real. Portalegre ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

A Minúcia técnica

As artes tradicionais são mais do que a criação de produtos eficazes para uma função prática. Combinam sentido estético com o domínio apurado da técnica, habilidade manual e o conhecimento do comportamento dos materiais. O apuramento decorativo de determinados artefactos, chega a ser comparável a técnicas que são próprias de outros materiais: as colheres de madeira, que fazem parte de uma arte conhecida como pastoril, são “bordadas”; as composições decorativas da técnica do empedrado da olaria de Nisa assemelham-se a rendas sobre o barro e a palha de trigo é usada como um fio para bordar com requintada delicadeza.

Estes e outros artefactos pretendem destacar a sofisticação que sobressai da minúcia técnica. A delicadeza das formas apuradas não é conseguida apenas através de máquinas e ferramentas de precisão. Aliás, não há maquinaria que consiga executar algumas destas técnicas. 

Cântaro ou Pote. António Louro, Graça Piedade. Nisa ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Colheres bordadas. André Panoias (Mal Barbado). Évora ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Palitos decorados. Fátima Lopes. Lorvão, Penacova ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cantarinha das prendas ou dos namorados. Maria Fernanda Braga. Guimarães ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Escultura em miolo de figueira. Maria de Fátima Costa. Faial, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Pano das Cartolas. Maria José Rocha (ADAPVC). Vila do Conde ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Lenço bordado a palha de trigo. Lina Silva. Faial, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Coração de Viana. AC Filigranas. Gondomar ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Composição com escamas de peixe. Berta Paiva. Capelas, S. Miguel, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Composição com escamas de peixe. Berta Paiva. Capelas, S. Miguel, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

O Abrigo

As mesmas mantas de lã que hoje em dia confortam e aquecem algumas casas também já foram proteção de pastores, com técnicas, cores e padrões que as caracterizam. A colcha de Castelo Branco, tecido de linho cru, bordado a fio de seda com cores, motivos e pontos que a diferenciam de outros produtos têxteis nacionais. A écharpe de seda natural, que saiu dos teares do Museu da Seda e do Território, está ligada a um conhecimento secular protegido e transmitido até hoje em Freixo de Espada à Cinta.

Dos teares, que noutros tempos constituíam um equipamento comum em muitas casas, saem também capas, saias e aventais, de técnicas diversificadas dentro do que a tecelagem permite, com mais ou menos introdução de cor, tendo a lã como material em comum. 

Apenas com o uso das mãos são produzidas uma diversidade de formas e executadas técnicas muito diversas, como a croça, uma engenhosa capa feita de torcidos, cordões e sobreposições de junco. A versatilidade da lã, é usada na ilha da Madeira, para a confeção do barrete de vilão ou de orelhas, elemento de traje icónico desta região do país, de onde também provém o chapéu de palmito, palma autóctone, feito hoje por um número muito residual de artesãs. Dos Açores, destacamos o chapéu de folha de dragoeiro, cuidado e habilmente entrançado e cosido pelas artesãs da ilha do Pico.

Colcha das Palmas. Maria Alzira Nunes e Maria Carminda Nunes. Fajã dos Vimes, S. Jorge, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Manta “Alvorada”. Sofia Brito (Fabricaal). Reguengos de Monsaraz ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Cobertor de papa bordado. Associação O Genuíno Cobertor de Papa. Maçainhas de Baixo, Guarda ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Colcha com a Árvore do Paraíso. Lurdes Baptista, Gracinda Marques, Ana Pereira, Anabela Rosindo e Rosa Gonçalves. Centro de Interpretação do Bordado, Castelo Branco ©Município de Castelo Branco

Écharpe. Júlia Braz. Museu da Seda e do Território, Freixo de Espada à Cinta ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Capa “Ilha”. À Capucha, em colaboração com Helena Cardoso e Grupo de Artesãs de Arões. Arões, Vale de Cambra ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Saia “Antracite”. Capuchinhas. Gosende, Castro Daire ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Saia Rica. Casa do Trabalho do Nordeste, em colaboração com José António Tenente e Isabel Roque. São Miguel, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Avental do traje regional do Baixo Minho. Fernando Rei (TEARTE). Aboim da Nóbrega, Vila Verde ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Croça ou Palhoça. Cristina Cardoso (Casinhas de Colmo). Termas do Carvalhal, Castro Daire ©DGARTES/Lino Silva/2023

Barrete de Orelhas ou Barrete de Vilão. Isabel da Eira (Enfia o Barrete). Camacha, Madeira ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Chapéu. Maria Alzira Neves e Maria Conceição Neves. Pico, Açores ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

Chapéu. Maria Amélia Melim. Porto Santo, Madeira ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2023

A Paisagem

Na paisagem colhem-se as espécies vegetais que nela habitam de forma espontânea, como a cana, a palma, o bunho, o bracejo ou a cortiça, ou que nela são cultivadas intencionalmente para posterior transformação, como o vime ou o linho, para nomear algumas das fibras mais utilizadas em Portugal. Caminhar com uma alcofa de empreita de palma é transportar um pouco da paisagem serrana algarvia. O tarro das regiões de pastoreio e de sobreiros, contém a paisagem da qual se extrai a cortiça de que ele é feito. Da paisagem alimentam-se as diferentes ovelhas autóctones das quais se extrai a lã que dá origem a produtos muito diferenciados regionalmente. É do solo que se extrai a argila, cujas diferentes características naturais influenciam a olaria que é produzida em diferentes pontos do país.

Filme A VOZ AQUI É O GESTO. Imagem, som, edição e realização de Jorge Murteira © DGARTES/ 2023

Itinerâncias