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Empreita de Palma

artes
©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2022

A empreita de palma consiste no entrançar de “tiras ripadas” da folha da palmeira-anã, em longas “fitas”, e é um dos elementos mais enraizados na cultura material algarvia. Era utilizada na realização de artefactos do quotidiano rural, no acondicionamento e transporte de bens e alimentos, em objetos para uso doméstico, nos trabalhos agrícolas, na pesca e em alguns objetos de uso pessoal.

Foi uma atividade económica relevante no Algarve, desde o século XVI e até meados do século XX, como está demonstrado em diferentes registos históricos e pautas alfandegárias, que testemunham a importância desta atividade enquanto produto de exportação. Mas também como produção em série orientada para o turismo e para o embalamento e transporte de mercadoria alimentar para exportação, como os figos secos. «Nos diversos discursos sobre a região — memórias, descrições, corografias, monografias — do séc. XVI em diante são recorrentes referências àquela que no Algarve quinhentista era já uma indústria próspera.» (OLIVEIRA, 2013). 

A matéria-prima (as folhas da palmeira-anã) é abundante e espontânea na região e por isso a produção de empreita de palma prospera. Inicialmente como complemento ao trabalho agrícola, juntamente com a produção da empreita de esparto, usada para os artefactos mais grosseiros, destinados a usos mais exigentes como o trabalho nas salinas ou o transporte de cargas pesadas no trabalho agrícola. A empreita de palma era produzida maioritariamente por mulheres, a par das lides domésticas, com maior incidência no inverno. O termo “empreita” ficou ligado a esta arte por ter sido, em tempos, paga em função da quantidade produzida por dia – pago à “empreitada” (BRANCO; SIMÃO, 1997).  

A prática numa escala doméstica foi gradualmente profissionalizando-se e, no início do século XX, apareceram espaços de produção e comercialização exclusivamente dedicados à empreita de palma. Um dos exemplos mais conhecidos é a Casa da Empreita, em Estômbar, fundada em 1916 por Margarida Vasconcelos  (SANCHO 2011). A iniciativa torna-se relevante em produção e inovação, apresentando continuamente modelos novos e chega a receber um prémio internacional em 1926. Outro é Loulé, onde a empreita era necessária para embalar os frutos secos para exportação e onde apareceram, na segunda metade do século, os primeiros armazenistas de revenda de artigos artesanais.

O modo de produção dominante pouco foi alterado ao longo dos anos. No início do processo, as folhas de palma são secas ao ar e depois ripadas pelas nervuras, resultando em “tiras” que variam de largura, em função do tipo de trabalho que se pretende. A “empreita” consiste na produção de longas “fitas” feitas a partir das tiras de folha entrançadas, de diversas larguras. Cada fita é arrumada em rolo à medida que é produzida, atingindo vários metros de comprimento. Tradicionalmente, as fitas são cosidas com “baracinha” ou “tamissa”, ou com tiras de palma, para dar a forma do objeto pretendido, criando um tecido contínuo com uma trama diagonal  (BRANCO; SIMÃO, 1997).

©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2022

As alcofas, as esteiras e as vassouras são os objetos mais referidos em antigos registos. Há ainda referência a condessas, alcoviteiras (alcofas pequeninas), balsas para transporte do almoço, gorpelhas para transporte de produtos sobre burros, seiras, chapéus ou palhetes, vassouros para caiar, capachos ou capacheiras redondas para moagem, abanicos e capachos para abanar o fogo. A variedade de artefactos é grande, havendo alguns objetos mais ligados à vida rural e outros à faina pesqueira, que caíram em desuso, deixando de ser produzidos. 

O entrançado da empreita continua, como tradicionalmente, a ser realizado maioritariamente por mulheres. A produção atual, impulsionada por um crescente interesse pelas produções artesanais, começa a atrair de novo os consumidores e estimula os artesãos a experimentar novos modelos e aplicações. Aparecem novos produtos para uso doméstico, decoração e uso pessoal. Este ressurgimento deve-se, em parte, à notável utilidade prática dos artefactos, que está a ser redescoberta no contexto de uma maior consciência ambiental, onde se privilegiam escolhas de consumo mais ecológicas. Nesse sentido, têm sido feitos vários esforços por entidades públicas para preservar a prática desta arte ​​através de abertura de espaços próprios, exposições e atividades de dinamização das artes e ofícios.

Técnicas

  • Embrandecer: Ou tornar maleável, colocando as tiras dentro de água. 
  • Branquear com enxofre ou enxofrar: As melhores fibras são submetidas a um processo de tratamento com fumo da queima de enxofre, sendo colocadas húmidas num local fechado, onde se queima uma pedra de enxofre. O recurso ao fumo de enxofre serve para remover a camada superior da folha, permitindo, por um lado, que a superfície fique mais branca, mas também porosa, para receber tingidura. Este tratamento também confere flexibilidade às fibras.
  • Ripar: As folhas são abertas para obter as tiras, também chamadas de “fervas”, de diferentes larguras, em função dos trabalhos a realizar. A largura das tiras define se a empreita é de primeira, segunda ou terceira qualidade.
  • Tingir ou pintar: Tingir tiras de palma para intercalar com as tiras de palma branqueada, de forma a criar motivos geométricos ou figurativos. O tingimento é feito a quente e através de imersão da palma, usando anilinas dissolvidas em água a ferver, seguido de um banho de água salgada para fixar o pigmento. As cores mais comuns são o verde garrafa, vermelho cor de vinho e roxo. 
  • Entrelaçar: Algumas horas antes de serem entrançadas, as tiras são salpicadas com água para as humedecer e ficarem mais macias. O entrançado de tiras de palma forma fitas, que são identificadas pelo número (sempre ímpar) de tiras usadas, normalmente entre 5 e 11, criando fitas tão longas quanto se deseje. Com as tiras ripadas, é também feito um cordel torcido fino, usado para coser – baracinha ou tamissa, esta designação varia em diferentes pontos da região. Este cordel é também utilizado na produção de vassouras, para atar um conjunto de folhas ou amarrá-las a um cabo feito de cana.
  • Coser: As fitas são justapostas e cosidas entre elas, usando uma agulha metálica e a baracinha, criando um tecido diagonal. Esta costura pode criar formas planas (para tapetes ou capachos) ou tubulares (para a produção de contentores ou das alças).
  • Bordado: Acabamento decorativo com lã (segunda metade do séc.XIX).

Bibliografia 

  • BRANCO, Conceição; SIMÃO, Jorge. (1997). Modos de Fazer. Guia do artesanato Algarvio. Região de Turismo do Algarve.
  • IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional / Delegação Regional do Algarve. (2005). Artesanato da Região do Algarve, Faro: IEFP/ DRA
  • IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional. (2011). Artes da Casa. Ambientes singulares.
  • LIMA, Rui de Abreu de (1993). Cestaria tradicional portuguesa. Feira Internacional de Artesanato. IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
  • LIMA, Rui de Abreu de (1997). Artesanato tradicional português III: Algarve. Lisboa: Direção-Geral de Turismo/ Associação Industrial Portuguesa.
  • PERDIGÃO, Teresa; CALVET, Nuno (2001). Tesouros do Artesanato Português. Vol. I: Madeiras, Fibras Vegetais e Materiais Afins. Lisboa: Verbo.
  • SCHMIDT, Luisa (coord.) (1994). Artefactos : o cesto e as peles. Cadernos do Expresso 2. Lisboa: Expresso / IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
  • OLIVEIRA, Catarina. (2013). “Empreita e cestaria no Algarve a partir de palma, esparto e cana. Antigos saberes, novos fazeres.” in Idades Entrelaçadas. Formas e memórias das artes de trabalhar fibras vegetais. Lisboa: IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
  • SANCHO, Emanuel (2011). “Uma casa voltada ao Sul” in Artes da Casa. Ambientes singulares. Lisboa: IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2022
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Folhas de palmeira anã. Mercado Municipal, Silves ©DGARTES/Vasco Célio-Stills/2022

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