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Cestaria de Vime

artes
©DGARTES/Estúdio Peso/2022

A cestaria de vime é uma das práticas mais presentes nas artes e ofícios em Portugal. Os principais centros de produção de cestaria em vime são Gonçalo, no concelho da Guarda, e Camacha, na ilha da Madeira. No entanto, a presença do vimeiro ou salgueiro em praticamente todo o país levou à disseminação desta arte em muitas regiões, de Norte a Sul, bem como nos arquipélagos dos Açores e da Madeira.

O cesto, principal produto desta arte, diz muito sobre as atividades e a economia dos seus produtores, utilizadores e territórios. A lista de nomes atribuídos aos diferentes cestos, pela sua forma ou aplicação, é longa e varia ao longo de todo o território nacional: cabaz, alcofa, mala, poceiro, giga, cofinho, ceira, açafate, amieira, canastra, gagreleire, condessa – referindo apenas as de uso doméstico. A cestaria de vime, pela sua robustez, estava presente em muitas atividades rurais mais exigentes, nomeadamente o “cesto vindimo” (de vindimas) na Madeira. 

«A obra de vime é classificada em três categorias: a obra leve, a obra média e o mobiliário. Os cestos de vários formatos para uso doméstico e os cestos utilizados nas tarefas agrícolas, como este “cesto vindimo”, inserem-se na segunda categoria.» (DRCM).

A grande variedade de formas e usos dos cestos deve-se sobretudo à criatividade dos artesãos, uma vez que as técnicas e ferramentas usadas pouco mudaram ao longo do tempo. Com o passar dos anos e a introdução de novos produtos e materiais, a tendência foi os cestos perderem a sua utilidade prática original enquanto utensílio de transporte, para ganharem um lugar mais doméstico e decorativo (LIMA, 1993).

O empalhamento de garrafões e garrafas de vidro, para proteção durante o transporte e uso, ou para decoração, foi outra das valências dos cesteiros que trabalham o vime. «Com técnicas similares, utilizando os mesmos materiais e ferramentas, forram-se garrafas de vidro, assentos de cadeiras e uma série de peças de mobiliário, criadas a partir de uma simples estrutura de madeira, que depois é forrada e ornamentada com entrançado de vime.» (CADA). 

O mobiliário é outra das aplicações desta fibra vegetal. Durante o século XX, um dos produtos mais comercializados e apreciados foram as cadeiras, que ainda hoje se podem encontrar em espaços públicos e privados. As suas denominações variam em função da origem geográfica, da forma ou da função, como a cadeira de bordadeira da Madeira, ou a cadeira de concha. Na ilha da Madeira, a produção de mobiliário em vime foi particularmente relevante e alguns dos modelos mais disseminados no país podem ter origem nesta região, como os cadeirões de um e dois lugares com mesa baixa, mesas, estantes e baús.

©DGARTES/Estúdio Peso/2022

O trabalho de entrelaçar as guias do vime exige que este esteja maleável. Assim, o vime é armazenado depois de cozido e seco, e aí deve ser demolhado de novo, pouco antes de ser trabalhado, para amaciar e facilitar o manuseamento e o entrelaçado. 

As varas do vime podem ser trabalhadas inteiras ou rachadas. Com o auxílio da “rachadeira”, uma vara pode dar origem a 3 ou 4 tiras cortadas longitudinalmente, denominadas “liaça”, que consistem em fitas de vime que passam ainda por uma “fiadeira”, de modo a calibrar a sua espessura. 

A produção de um cesto começa pelo fundo, através do cruzamento das varas  (denominadas “ástias” na ilha da Madeira) que irão definir a sua forma e tamanho. Depois de tecido o fundo, levantam-se as guias. As paredes do cesto crescem com conformação manual ou com recurso à utilização de moldes de madeira, que permitem a constância das dimensões, bem como a reprodução uniforme das diferentes tipologias de cestos (PIRES, 2013).

Como ferramentas, são utilizados o furadouro, o martelo, pregos de vários tamanhos, a tesoura de podar, a fieira (ou “endireita toros”) e a “rachadeira”. 

Em função da origem geográfica da produção e do gosto do artesão, as obras têm diferentes tipos de acabamento e efeitos decorativos. As diferentes espécies de vime e o tipo de tratamento dado às varas – com ou sem casca, cozidas ou queimadas,  envernizadas – conferem colorações distintas, que variam entre o amarelo muito claro, o verde, o cinza e o castanho avermelhado. Estas colorações são, por vezes, conjugadas numa mesma obra, para criação de efeitos decorativos.

No continente, o trabalho em vime mantém-se com produção de norte a sul, nas vertentes de cestaria e do mobiliário. Os distritos de Braga (Barcelos) e da Guarda concentram grande parte da produção, onde se destaca Gonçalo, o centro mais representativo do país. Também se encontram produções no distrito de Évora (Montemor-o-Novo) e de Faro (Monchique e Castro Marim), sobretudo no trabalho de cestaria.

Na ilha da Madeira, apesar do conhecimento estar vivo, a falta de procura no mercado levou a um acentuado declínio da obra de vime (terminologia local). Existe no Parque Temático da Madeira, na Camacha, uma oficina onde trabalha um artesão, demonstrando todo o processo de tratamento do vime e de produção de artefactos, que são vendidos no parque (PERDIGÃO, 2013).

Nos Açores, «embora enfrentando um período difícil, o trabalho em vime continua a ser uma referência associada à tradição e à cultura do arquipélago. Os vimes, muito abundantes no passado, têm sido reintroduzidos em algumas paisagens não só com a finalidade ambiental de proteger as margens das ribeiras contra a erosão, mas também com uma finalidade social e económica, no sentido de fornecer matéria-prima para o artesanato local.» (CADA). A obra em vime está presente nas ilhas do Faial, Santa Maria, Terceira e São Miguel, contando ao todo com cerca de nove artesãos, incluindo cestaria e empalhamento de mobiliário de vime.

Bibliografia

  • BRANCO, Conceição; SIMÃO, Jorge. (1997). Modos de Fazer. Guia do artesanato Algarvio. Faro: Região de Turismo do Algarve.
  • Cestaria. In Centro de Artesanato e Design dos Açores (CADA). http://artesanato.azores.gov.pt/artesanato/fibras-vegetais/cestaria-2/ [Consultado em 3 de Novembro de 2022]
  • Empalhamento. In Centro de Artesanato e Design dos Açores (CADA).. http://artesanato.azores.gov.pt/artesanato/fibras-vegetais/empalhamento/ [Consultado em 3 de Novembro de 2022]
  • KUONI, Bignia. (2003). Cestería tradicional ibérica. Barcelona: Ediciones del Serbal.
  • LIMA, Rui de Abreu de. (1993). Cestaria tradicional portuguesa. Feira Internacional de Artesanato. Lisboa: IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
  • O Cesto Vindimo. In Direção Regional de Cultura da Madeira (DRCM). https://cultura.madeira.gov.pt/obras-e-artistas1/518-o-%E2%80%9Ccesto-vindimo%E2%80%9D.html [Consultado em 3 de Novembro de 2022] 
  • PERDIGÃO, Teresa; CALVET, Nuno. (2001). Tesouros do Artesanato Português. Volume I: Madeiras, Fibras Vegetais e Materiais Afins. Lisboa: Editorial Verbo.
  • PERDIGÃO, Teresa. (2013). “Vimes da Madeira” in Idades Entrelaçadas. Formas e memórias das artes de trabalhar fibras vegetais. Lisboa: IEFP – Instituto do Emprego e Formação Profissional.
©DGARTES/Vasco Célio – Stills/2022
©DGARTES/Estúdio Peso/2022
©DGARTES/Vasco Célio – Stills/2022
Vime. Vila do Porto, Açores ©DGARTES/Estúdio Peso/2023

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